NEM SAUDOSISMO, NEM DESENCANTO E NEM FRUSTRAÇÃO!

Quem foi, por algum momento, protagonista ou, pelo menos, espectador engajado, da cena política nacional, notadamente nos estertores dos anos setenta, quando do início da distensão lenta, gradual e segura; quem participou da luta pelas “diretas já” que, embora frustrada a empreitada, culminou na eleição de Tancredo Neves, pelo Colégio Eleitoral; quem sentiu, de perto, as discussões e questionamentos de quem deveria substituir o Presidente enfermo, o que conduziu a posse de Sarney; quem participou do início do governo da chamada Nova República, necessariamente há de ter muita coisa a falar, muita coisa a dizer, muita coisa a festejar e, também, a lamentar!

E, de uma certa forma, tais personagens talvez vivam um certo orgulho e contentamento, de uma parte, por ter assistido, participado e contribuído para a consolidação das instituições e para a construção de um verdadeiro pacto social pelo e para o País!

Mas, alguém há de convir que, de outra parte, tais atores daquela cena ou daqueles episódios, devam sentir um certo gosto amargo e vivenciam uma certa frustração, por sentir que a política que se faz hoje não tem o “glamour”, o compromisso e o respeito que os líderes do passado experimentavam. E mais. Temem hoje, pelo esgarçamento das instituições, diante do seu aparelhamento e da sua perda de credibilidade. Vêm, na gestão pública, que a meritocracia é um conceito que ficou fora de moda e o compadrio ideológico e os interesses inconfessos, são as bases da ocupação de espaços, na estrutura de poder no País. E, em face do quase desaparecimento, da cena política, de homens de sonho e de esperança, se esfumam as expectativas de que as coisas tendam a melhorar.

Viviam-se, aquela época, tempos onde o eleitor sabia em quem tinha votado e, de uma certa forma, mostrava um orgulho todo especial pelo seu deputado, diante dos seus esforços, de suas propostas, de suas idéias e, acima de tudo, de suas atitudes. Havia a presença da esperteza na cena política mas, muito mais do que isso, havia a presença da vaidade de ser um protagonista com dignidade, decência, competência e compromisso.

Foram anos difíceis e dramáticos aqueles, particularmente, durante o chamado período em que prevaleceu o estado autoritário! Com uma espécie de espada de Dâmocles sobre a cabeça, viviam os sonhadores e os homens daquele tempo, espécie de heróis “ensandecidos de esperança”, todos os riscos inerentes de confrontar um poder que não se dispunha a dividi-lo com os demais cidadãos! O período em que se construia a transição e a criação das bases e os pilares das novas instituições do chamado estado democrático de direito, foi de luta, de determinação e, acima de tudo, de humildade perante os fatos e as circunstâncias.

Marchava-se em busca do itinerário de estruturação das bases de convivência democrática entre os antigos e recentes detentores do poder, de um lado, e, aquela coisa ainda amorfa e confusa, que eram as forças ditas progressistas, do outro lado. E nesse campo estavam esquerdistas empedernidos, comunistas consagrados, pelegos reabilitados, direitistas com visão estratégica, direitistas oportunistas e direitistas mais radicais nos seus conceitos e na solução de conflitos no País. Ou seja, era um ajuntamento de entes, num primeiro momento, “unidos por um só ideal”.

Era com esse tipo de presença, que envolvia, por um lado, desde o deputado Chico Pinto e Fernando Santana, da Bahia; passando por Heitor de Alencar Furtado e seu pai, Alencar Furtado, indo até José Martins Rodrigues, Paes de Andrade, Freitas Nobre, Paulo Brossard, Theotônio Vilella, além do velho guerreiro, Ulysses Guimarães e, com certeza, muitos outros.

Foram fases e momentos inesquecíveis da vida nacional. A empreitada de homens da dignidade de um Djalma Marinho, sem violência, sem truculência, mas, apenas apoiado no embate das idéias e convicções, permitiu começar a construir o estado democrático de direito, tão necessário à convivência pacífica dos contrários.

“E hoje o que resta dos heróis gigantes” de antanho? Parece que tudo está se desmoronando, que tudo está se desmilinguindo! Ou será tudo uma espécie de miragem ou tudo não passaria de uma possível atitude saudosista de quem perdeu a esperança e se desencantou com os políticos, as instituições e os valores professados pela sociedade brasileira?

A política, por certo, não é mais a arte da controvérsia. A política não está mais a serviço da mediação dos conflitos entre os vários grupos sociais. A política não é mais a atividade dos ímpios, como dizia Otto Lara Rezende. A política, nos dias que correm, é a arte da esperteza, é a competência para apropriar-se de patrimônio publico ou, de mínimo, exercer tráfico de influência para garantir ganhos significativos para empresários que se travestiram de políticos.

E, quem cuida do interesse público? Ninguém mais! O embate partidário não é mais de ideologias, de doutrinas, de programas e de idéias mas, tão somente, o confronto de acusações, de mentiras e de troca de denúncias de toda ordem e o discurso fica reduzido à mistificação, à “embalagens” elaborada por marqueteiros talentosos, bem a gosto de enganar o eleitor!

E o cidadão de boa fé se pergunta: qual o sentido de ir as urnas escolher um candidato se ele não tem um programa, estabelecido e construído de forma convincente, bem como a sua história está marcada por desvios de comportamento, por processos na justiça e por suspeição de haver cometido erros dos mais variados escopos?

Na verdade, o cidadão, como que parafraseando o poeta português José Régio, acabaria, num misto de indignação e revolta, dizendo: “Não sei para onde vou; não sei como vou mas só sei que não vou por aí”.

2 Comentários em “NEM SAUDOSISMO, NEM DESENCANTO E NEM FRUSTRAÇÃO!

  1. Excelente análise da ação dos polítcos nos últimos anos.

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