LULA, A DESCIDA DA LADEIRA!

O Presidente Lula parece enfrentar profunda crise existencial porquanto somente problemas de tal ordem poderiam explicar as suas atitudes e declarações recentes. Isto porque nada poderia justificar as suas explosões de ira contra a imprensa, o tratamento debochado às decisões do TSE em relação a multas a ele aplicadas por flagrante desrespeito à legislação eleitoral e a agressiva e pesada crítica, proferida pelo Presidente ao relatório do TCU. Relatório este, procedente e oportuno, sobre a preferência político-eleiçoeira do Ministério da Integração Nacional ao garantir uma soma trinta vezes maior de recursos da Defesa Civil à Bahia, vis-à-vis do que concedeu ao Rio de Janeiro.

Se antes Lula fazia ásperas críticas aos órgãos de proteção ao meio ambiente, ao Congresso, as decisões dos partidos, Lula, nas suas últimas incursões internacionais foi a uma espécie de paroxismo. Interferiu na questão de Honduras, de maneira intempestiva e imprópria; reafirmou todo o seu apreço a Fidel, indo ao extremo de não receber os apelos dos dissidentes que pediam a sua mediação para que os “presos de consciência” não continuassem morrendo em greve de fome; fez declarações e garantia de apoio ao Presidente do Irã, provocando a ira dos que querem o controle de armas nucleares e, pasmem, se prontificou a resolver o problema milenar da Palestina, não sem antes cometer gafes e mais gafes que geraram mal estar e revolta entre os israelenses.

Parece que Lula vive o que se chama os efeitos desnorteadores e desequilibradores, em termos emocionais, que acometem aqueles que começam a antever ou a vivenciar a antevéspera de seu “crepúsculo outonal”. Ou seja, às vésperas do desembarque do poder, a inteligência e a lucidez se turvam, a ponderação desaparece e o bom senso se esvai, notadamente de quem viveu oito anos de “Cinderela” e agora tenha que voltar à planície!

Não era para vivenciar e experimentar tanta angústia, inquietação e irritação, alguém que cavalga os seus 80% de apoio popular interno e que, inobstante os equívocos internacionais, o frenesi externo em torno do seu nome.

Internamente, as atitudes de Lula, ao confrontar as Forças Armadas, a Mídia, as religiões cristãs, o agronegócio e a justiça, com o seu malfadado Programa Nacional de Direitos Humanos, conseguiram despertar a reprovação de muitos, inclusive de antigos admiradores, como o ex-senador Paulo Brossard que, das coxilhas do Rio Grande, faz críticas duras, mas educadas, a Lula em artigo publicado no Correio Braziliense de 10 de abril último.

De repente, “as trapaças da sorte” dizem para Lula que a fragilidade humana pode mais que a vã filosofia pensa e quer. De repente, “um piripaco” e o “estadista mundial” recebe um “jab” de direita que o coloca, zonzo, nas cordas e só permitirá que ele acorde quando já houver desembarcado de todas as honras e de todas as glórias.

Mas, todos têm que reconhecer que o poder é bom e acostuma mal quando, numa sequência continuada, tudo dá certo. Porque, como dizia um dessas figuras populares do Nordeste, mas cheio de sabedoria, que “o poder é bom porque a gente não precisa abrir porta e nem puxar a carteira”.

Acho que Lula começa, antecipadamente, a sentir que só o vento baterá à porta e o café servido já virá meio frio. E, nem Dilma, mesmo que eleita, devolverá a ele todo o charme, o glamour, as lantejoulas, os rapapés e o “saudável” papel do puxa-saco, tão indispensável e fundamental ao poder porquanto, superou tantas desditas que poderiam ter ocorrido. Imagine um bajulador eficiente no quarto de Getúlio, teria impedido o seu suicídio. E o mesmo chalaça, no porre que antecedeu a renúncia de Jânio, teria, certamente, impedido a renúncia.

Portanto, o que se sente é que Lula vive já, angustiado, o momento de descer à planície e enfrentar os fantasmas da perseguição, da falta de aplauso e reconhecimento e o fato de, depois de ter subido tanto, ter que se acostumar ao patamar de sindicalista e de ex!

CIRO MERECE O RESPEITO DE TODOS!

Este cenarista tem o privilégio de conhecer Ciro Gomes ainda quando ele era um jovem cheio de sonhos, desafios e esperanças. Em Sobral, aos dezessete anos, Ciro buscava mostrar “serviço” ajudando ao pai, o Dr. José Euclides, como prefeito da ilustre Vila de Caiçara.

Desenvoltura, inteligência, presunção e, acima de tudo, uma capacidade enorme de articular idéias e externá-las, com excepcional competência, Ciro foi abrindo caminhos para si e para os seus.

Ciro só teve uma parceria na vida, mantida até hoje, que foi com Tasso Jereissati que o viu, o descobriu, o patrocinou e acreditou no seu talento. E, mesmo com todas as tentativas de intrigar Ciro e Tasso, ninguém conseguiu perturbar essa relação. Isto porque Tasso, apesar de suas indiosincrasias, sempre foi um esteio para que Ciro abrisse os seus caminhos, com sua atitude polêmica, agressiva e brigona.

Vive Ciro o seu momento do “Coronel em seu labirinto”. Usado por Lula, a quem dedicou admiração e respeito, Ciro não pode confessar, como bom político que é, que foi enganado. Aliás, político que se preza não confessa fracassos e nem que foi enganado. Político para sobreviver, ao adoecer, nunca entra em uma ambulância, pois que, com tal gesto, anuncia a sua falência política. Assim fez Ciro, mas, para tanto, mesmo diante das adversidades, foi construindo pontes pelo caminho, até fazer do irmão, governador do Ceará!

O Ciro que este cenarista conhece, que não desiste nunca e que mantém as suas convicções, mesmo que sejam vistas por muitos como polêmicas e confusas, tenta mostrar ao seu partido que, a sua candidatura fortaleceria, em muito, o partido, a nível nacional. Aliás, é mais uma batalha perdida, pois que o Presidente de seu partido, na luta pela sua própria sobrevivência, depende do apoio do PT na área metropolitana do Recife. Ciro buscou convencer Lula, sem êxito, que uma eleição plebiscitária não seria uma boa alternativa para o poder e a sua manutenção. Mas enfrentou a presunção e a arrogância de Lula que não compactuou com a sua idéia e fixou-se, dramaticamente, em um projeto que não tem nada a ver com ele, nem com a democracia e nem com o país.

Está Ciro às voltas com a sua teimosia de se manter candidato a Presidente, parecendo o filme “O povo contra Larry Flint”, só que, nesse caso, não é o povo, mas sim, Lula, o “status quo” e o seu partido, contra o jovem sobralense, paulista por acidente e por acaso. E Ciro está prestes a “jogar a toalha” e desistir do seu propósito, da sua proposta e de seu intento. A pressão é grande e ele é cativo dos afetos e projetos que criou, no caso, o seu irmão governador.

Este cenarista, que um dia foi brindado com o mais belo discurso, em sua homenagem, proferido por Ciro Gomes tem o dever de, mesmo discordando dos seus arroubos, de sua agressividade verbal e de tantas outras coisas, registrar aqui, o respeito, a admiração e o carinho para com um jovem que, pode ter todos os defeitos, mas nunca teve o do oportunismo nem do pragmatismo cínico de tantos.

Vá em frente, Ciro! E, se não der certo, não se frustre e nem se magoe. Lembre-se de Fernando Pessoa de que a “obra feita é comigo, o por fazer é com Deus”!

O RIO E A QUESTÃO URBANA NACIONAL!

Uma coisa é certa. As pessoas só tendem a cuidar de um problema quando ele se tornou de tal monta, tão grande, que não há como fugir de enfrentá-lo. Se existe algo que o Brasil nunca institucionalizou foi a preocupação em definir cenários possíveis para o seu amanhã e, a partir de tais cenários, estabelecer opções de políticas públicas destinadas a criar rumos de ação e adotar medidas preventivas para problemas e dificuldades.

Falar que o Brasil, desde a época de Delfim Neto, como “tzar” da economia, abandou, de vez, qualquer veleidade de um planejamento estratégico, nem que fosse de característica indicativa, é senso comum. Recentemente, alguns estudiosos têm ousado a, pelo menos, discutir a “agenda perdida” pelo Brasil, máxime na década passada, e propor uma nova agenda para inserir o País no contexto do crescimento econômico mundial.

Para certos economistas, ditos pragmáticos, planejamento ou visão estratégica de futuro é coisa de futurologia ou exercício acadêmico de pseudo-economistas desocupados e diletantes. Mas, a tragédia do Rio, que veio após a tragédia de São Paulo; que se fez após a desgraça de Angra dos Reis e que ocorreu logo depois do que se abateu sobre Santa Catarina, mostra que as cidades brasileiras não foram preparadas para situações como as que ora atingem o Rio de Janeiro.

Até um sistema mínimo de monitoramento do clima para antecipar tempos de pluviometria incomuns e, consequentemente, permitir a evacuação de áreas de risco, inexiste. Alguém diria, mas, se por acaso, se pretendesse remover populações para novas áreas, na transição, que estrutura se teria para tanto? Ora, isto é tão fácil e as Forças Armadas mostraram como tal logística pode ser aplicada, como ela fez agora no Haiti.

O problema é outro. Não se faz planejamento urbano. Não se tem uma Defesa Civil aparelhada, não se tem coragem de retirar populações em áreas de risco e, até um programa saudado como importante de urbanização de favelas, tem como previsto, para este ano, talvez atender mais cinco favelas das mais de seiscentas existentes. E o que se faz para não permitir a expansão das mesmas? O que se tem feito em termos de transportes de massa para as populações de baixa renda? É. A agenda é extensa, a sensibilidade é pouca e o compromisso inexiste!

A CIDADE PARTIDA.

Em 1948, o grande diplomata, político, empresário e poeta Augusto Frederico Schmidt, escreveu notável artigo sobre o drama da cidade do Rio, dividida, de um lado, pelas favelas marcadas pela pobreza e pela exclusão social e, de outro, pelos elegantes bairros da classe média alta e alta, da cidade maravilhosa.

E, a cada dia que passa, o fosso aumenta. Se os dados não mentem, as favelas já somam mais de 600 áreas com uma população crescente, apinhada e pendurada nos morros cariocas. E, a cada dia que passa, novas edificações vão sendo construídas, de maneira irregular, com todos os riscos possíveis, sendo, hoje, tais morros, objeto de uma dramática especulação imobiliária.

E o que fazem os políticos, os governantes e a chamada elite brasileira? Lamentavelmente, ou culpam “razões estruturais” ou a impiedosa natureza ou os governos passados que nada previram e nada planejaram para impedir que tais desastres viessem ocorrer.

E, em nada se fazendo, o fosso entre as duas cidades irá crescendo e superando os limites do controlável e do saneável. “That’s a pity”!

A IRRESPONSABILIDADE, A FALTA DE PLANEJAMENTO E A LENIÊNCIA DAS AUTORIDADES.

Os dados da tragédia de Niterói, por exemplo, são demonstração patente da negligência e da irresponsabilidade das autoridades porquanto, o morro que veio abaixo, soterrando inúmeras casas e matando várias pessoas, não era bem um morro mas, pasmem, um imenso lixão desativado faz mais de vinte anos! Já imaginou quão criminosa foi a atitude de governantes ao permitirem tal desordenada ocupação, em cima de “terra movediça” e sobre todos os possíveis focos de doença? Mesmo que o morro fosse de terra firme, não se poderia permitir construções sem antes se constatar a estrutura de seus solos porquanto, de um modo geral, esses morros são formações de pedra e a camada de terra sobre a pedra é muito pequena. E, diante de chuvas torrenciais, o morro faz escorrer essa pequena camada de terra e o que estiver, fragilmente, assentado em cima dela.

Ademais, nas favelas do Rio, a construção de edificações, sem cálculo estrutural que as sustente, com vários andares, representa um enorme risco para as populações que são vítimas desse movimento especulativo nos terrenos dos morros.

O MORRO NÃO TEM VEZ…

A tragédia que se abateu e ainda se abate sobre o Rio de Janeiro, com a sua esteira de dramas e infortúnios, mostra que, mais do que nunca, a ocupação dos morros da bela cidade maravilhosa nunca deveria ter sido permitida por razões de estrutura dos solos, da falta de planejamento para a sua utilização e pelos erros registrados na concepção e na realização de suas construções.

E a tendência é a de que, passada essa tragédia, as autoridades voltarão a sua mesmice e nenhuma providência honesta, corajosa e determinada será tomada. Também, diante de um ano eleitoral, aí é que medidas antipáticas como remover todas as populações de áreas de risco, suspender qualquer construção nos morros e fiscalizar a ampliação de construções precárias nas favelas, não serão adotadas.

Ademais, um urgente processo de urbanização de favelas além de reduzir os níveis de violência, pelo abandono de territórios pelos senhores do tráfico de drogas, faz-se necessário. Mas quem tomará tais decisões com a seriedade, a urgência e a diligência requeridas?

O CONFRONTO DE ESTRATÉGIAS.

A estratégia de Serra já parece bastante clara para a maioria dos analistas políticos. Serra se assentou em três pilares básicos:

a) O “timing” das decisões relativas ao lançamento de sua candidatura, da exposição de idéias junto à mídia, da discussão do vice e da definição de palanques, seria de sua inteira responsabilidade, apoiado no seu “feeling” e na sua crença. Segundo os seus adversários, baseada na numerologia dos momentos mais adequados e oportunos;
b) Não aceitaria o jogo de Lula de ser o defensor do confronto de idéias entre a era FHC e o período lulista. Ao contrário, apropriando-se de uma idéia desenvolvida por Aécio, encarnaria o pós-Lula, ou seja, alguém que não iria contra a corrente, mas que, olhando para o futuro, buscaria aperfeiçoar as conquistas da era lulista;
c) Concordaria que toda a política econômica está certa nos seus fundamentos, apenas não aceita que o Brasil tenha a taxa de juros maior do mundo; que o déficit no balanço de transações correntes chegue a 49 bilhões quando antes tinha o País superávit e que não aceita os desperdícios de gastos de custeio abusivos que aumenta a dívida interna líquida e não dá espaço para o crescimento do investimento.

E, se tais pressupostos não bastassem, a sua idéia seria a de mostrar aos brasileiros que, no confronto de competências e experiências, ele é bem melhor do que a sua contendora.

Por outro lado, a estratégia de Dilma, a par de se buscar consolidar como o “Lula de saias”, buscará demonstrar que Serra, “um lobo em pele de cordeiro”, não é a figura mansa que procurar mostrar-se à sociedade e, diferentemente do que busca demonstrar, é um anti-Lula que, assumindo o poder irá acabar com o PAC, desmontar o Bolsa Família e voltar ao governo dos ricos e para os ricos.

A primeira coisa que preocupa Dilma agora é desconstruir o pós-lulismo de Serra e caracterizá-lo como o representante “do atraso, do preconceito e da elite branca paulista, contra pobres, trabalhadores, sindicalistas e nordestinos”. Ademais, procurará desmontar as ações de Serra dizendo que “até o apagão ao tempo de FHC” foi culpa da falta de planejamento, isto é, quando Serra era o Ministro do Planejamento de FHC. Numa recorrência ao passado, Dilma procurará demonstrar que os tucanos “quebraram o país, entregaram o patrimônio público a amigos e não conseguiram promover um crescimento saudável, a não ser o chamado vôo de galinha”. Com o PAC 2, Dilma continuará a dizer que ela está defendendo o aumento do investimento e continuando a notável obra de Lula. Ela se manterá sempre atrelada à imagem de Lula.

Serra, por outro lado, afirma que “nada de olho no retrovisor”, pois o povo não quer discutir o que já conquistou, mas sim, o que o amanhã lhe pode oferecer e proporcionar. Serra quer ainda cristalizar na cabeça das pessoas a idéia de que a sua experiência, a sua competência gerencial já demonstrada, a sua capacidade de articulação e negociação o caracterizam como o “mais preparado dos dois para exercer o papel de substituir Lula”.

E, já que Lula diz que todos no país são de esquerda, então Serra é um dos mesmos, e, portanto, não poderia sofrer restrições dos que querem a modernização e o crescimento, com justiça social.

DUAS TRISTES NOTÍCIAS!

O belo Rio de Janeiro, de todos os brasileiros, continua lindo embora impiedosamente machucado. Não pela natureza, como alguém poderia imaginar diante das agruras que sofrem agora os cariocas, mas pela incúria, irresponsabilidade, incompetência e má fé de sua classe política e de seus governantes.

As mais de cem mortes, em decorrência da pesada pluviometria que se precipita sobre a cidade, nada têm a ver com as chuvas e sim com a ocupação desordenada do espaço urbano; com a invasão de áreas de risco; com a falta de infra-estrutura em termos de galerias de águas pluviais, de saneamento ambiental, de proteção da mata ciliar bem como da falta de investimentos fundamentais em obras essenciais para a garantia de uma adequada drenagem de tais águas.

Se isto já dói, face o descaso e a incúria dos gestores públicos que, de há muito, vem acompanhando o processo de deterioração dos espaços dessa cidade maravilhosa e nada tendem a fazer para conter abusos e vícios na ocupação dos espaços e construção das obras básicas de infra-estrutura, outra notícia que constrange o País, como um todo, é o drama do saneamento básico do País.

Os jornais estamparam os dados que envergonham aqueles que fazem o estado brasileiro. Na verdade, a cobertura do saneamento ambiental apenas atinge 23% das populações rurais do País, em termos de esgotamento sanitário. E o mais grave é que, é senso comum e não é desconhecido das autoridades da área de saúde do país que, para cada um real gasto em saneamento básico, economiza-se cerca de 3 a 5 reais em gastos com saúde curativa no País! E também se sabe que 55% da mortalidade infantil deriva de contaminação hídrica! Ou seja, basta que haja água potável e que os esgotos não se misturem à água de beber das pessoas, que se consegue reduzir, substancialmente, a mortalidade infantil.

E, o mais grave, é que não é difícil construir toda uma rede de proteção, em termos de saneamento ambiental, notadamente nas pequenas comunidades.

Portanto, diante do que ocorre no Rio, onde nem o Estado e nem a União resolvem interditar as áreas de risco; nem tampouco remover, até mesmo na marra, as populações ali localizadas; nem sequer tentar urbanizar e reorganizar os espaços críticos e de risco, mas recuperáveis; reexaminar toda a rede de águas pluviais das cidades afetadas bem como construir muros ou arrimos de contenção em áreas propícias a desmoronamentos, além de estabelecer um processo educativo das populações quanto ao destino final do lixo, então os problemas continuarão com toda a sua esteira de tragédia.

Como dizia Miguel de Unamuno, ao discorrer sobre os dramáticos episódios da guerra civil espanhola – “Me duele España!” – este cenarista parafraseia dizendo que Me dói o Rio diante do dilúvio que se abate sobre a cidade e seu povo. Onde está o PAC? Cadê a briga do pré-sal que não se volta para um compromisso maior de salvar esta maravilha do Universo? Onde estão os homens públicos do Rio e de Brasília que não assumem um processo de interdição sobre tais descalabros e, emergencialmente, aproveitando a dor e o desespero de muitos, não tomam as atitudes mais duras de remoção de populações, de reocupação de áreas públicas e de início de obras de saneamento ambiental fundamentais?

ESTADO FORTE VERSUS ESTADO “ATIVO”.

Dizia o Presidente Lula, faz poucos dias, que a campanha eleitoral para Presidente não o preocupava, pois que todos os candidatos eram de esquerda. Nos dias que correm, ninguém sabe mais o que é de esquerda ou de direita. O que se sabe é que, para começo de conversa, ninguém aceita mais ser rotulado sequer de liberal.

Nos Estados Unidos e na Europa ser liberal é defender o exercício pleno da cidadania, é garantir as liberdades individuais, é permitir o amplo direito à livre escolha bem como é viver em um ambiente onde as habilidades, os talentos e as competências individuais encontram campo e ambiente propício para o seu desenvolvimento. Na verdade, os liberais não são conservadores e não se prendem a dogmas que venham a reduzir os seus espaços de pensamento e movimentação.

Já no Brasil… Bem, no Brasil ninguém mais aceita ser rotulado de liberal, pois que para a leitura da imensa maioria, liberal é um conservador empedernido, um defensor das minorias privilegiadas, um cidadão mais propenso a estabelecer preconceitos contra “preto, pobre e trabalhador” e que não se importa se a distribuição de renda piora e gera mais e mais exclusão social.

Se se exclui da discussão tais conceitos, e, de forma mais responsável e respeitável, retoma-se a discussão sobre o estado e o seu papel, é interessante examinar como pensam os dois presidenciáveis mais bem aquinhoados com as preferências populares.

Dilma, conforme se manifestou no encontro do Partido dos Trabalhadores, quando foi ungida a candidata de Lula e, portanto, do PT, para disputar a Presidência da República, defende um estado forte e capaz de ser o indutor e o promotor do crescimento, além de cumprir o seu papel de regulador. Ou seja, o protagonismo do estado no modelo imaginado por Dilma se assemelha, em muito, as diretrizes contidas no Programa Nacional de Direitos Humanos onde ficou registrado que, não só o estado deve resguardar e até ampliar as conquistas sociais mas que, na ausência de uma iniciativa privada determinada, caberá a esse mesmo estado substituí-la e tornar-se protagonista, como empreendedor de ações e investimentos estratégicos do País. No seu modelo, defende estatais fortes, associações do estado com grandes empresas nacionais para o enfrentamento da concorrência internacional além de uma ação mais ousada na regulação, não só via agências de governo mas, também, via ação dos bancos públicos, fundos de pensão, entre outros.

Para Serra, de formação de esquerda bem mais completa e mais profunda que Dilma, o que ele defende é um estado que ele chama de “ativo”, que não se confunde com estado “máximo ou mínimo”, forte ou qualquer outra denominação, mas um estado capaz de estabelecer políticas públicas melhor estruturadas e direcionadas bem como intervenção e regulação onde for exigido. Serra, quando Ministro da Saúde, ao estabelecer quebra de patentes de alguns medicamentos fundamentais ao sistema de saúde brasileiro, o fez após esgotar todas as tentativas de negociação, de tal forma que não deu margem a qualquer tentativa de retaliação dos países-sede de tais laboratórios.

Na verdade, após a retirada das baboseiras do Programa Nacional de Direitos Humanos; da revisão do novo código de mineração; da tentativa de transformação da Petrobrás em um estado dentro do estado, além de outras iniciativas de cunho estatizante e retrógrado, as idéias de Dilma Rousseff se aproximam da média do pensamento nacional e, diferentemente do que se pensa, em nada diferem das idéias de José Serra.

O que deverá diferenciar os dois é na explicitação de tais idéias; na capacidade de traduzi-las em algo digerível pela maioria da população e no convencimento de que o debate de idéias irá respaldar o discurso dos candidatos. O certo é que o discurso de Serra, ao falar como economista e didaticamente, como professor da matéria, não mais assusta o mercado. Ele não precisará de um vice que dê a ele o tal do “nihil obstat” que Dilma irá necessitar.

Portanto, o discurso de ambos deverá ser mais palatável quando falarem em reduzir a dívida, ampliar o crescimento, crescer o investimento e aumentar e melhorar a eficiência dos projetos sociais, ficando os questionamentos sobre a forma de como fazer e viabilizar tais propósitos.

40 HORAS, UMA QUESTÃO COMPLICADA!

Ninguém, em sã consciência, poderia colocar-se contrário a qualquer conquista dos trabalhadores. Na verdade, se se examinar a situação, em termos de carga horária de trabalho, na grande maioria das nações desenvolvidas, o tempo de trabalho semanal gira no entorno das quarenta horas.

Mas, no caso brasileiro, tem sentido estabelecer-se como regra geral tal regime? Será que micro e pequenas empresas e as pequenas prefeituras terão estrutura para aguentar mais esse encargo? Será que a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais não produzirá e induzirá a um aumento da informalidade e, consequentemente, menos pessoas com carteira assinada na economia nacional? E, o que pensar da competitividade dos produtos nacionais vis-à-vis de produtos chineses, por exemplo, que hoje são colocados no mercado brasileiro por valores que alcançam até um terço do valor do similar nacional?

A proposta, necessariamente, parte dos sindicalizados que já fruem desse privilégio, no caso, bancários, professores, metalúrgicos e outras categorias melhor organizadas do centro-sul do País. Mas, tais líderes de trabalhadores, por acaso, procuraram verificar qual seria a prioridade de conquistas destes valorosos companheiros que não dispõem de um sindicato forte para defendê-los?

Ao que parece, considerando que em uma cidade como São Paulo, os trabalhadores gastam cerca de quatro horas para ir e voltar ao trabalho, será que, para esses, não seria melhor que o transporte de massa intermodal pudesse reduzir tal tempo de viagem de quatro horas para, por exemplo, uma hora para ir e para voltar para o trabalho, não seria uma notável conquista? Será que lutando por um trabalho mais profundo e sério em termos de enfrentamento da violência urbana, não estariam contribuindo muito mais para a tranquilidade e o bem-estar de tais trabalhadores e suas famílias? Será que, se colocassem toda a sua força política para que as prefeituras, junto com os governos estaduais, garantissem os terrenos para o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida não estariam, não apenas garantindo um direito social fundamental aos trabalhadores, mas contribuindo para o aumento da produtividade de tais trabalhadores e para o aumento da eficiência das empresas e maior competitividade de seus produtos?

Parece que está chegando a hora de acabar com propostas demagógicas, inviáveis e irresponsáveis que, inadvertidamente, alguns trabalhadores acham que elas podem acontecer. Não sabem eles que elas representam uma inviabilização do seu atual emprego e o fim da esperança de muitos que estão no aguardo de uma oportunidade de trabalho condigna.

Ano eleitoral é assim. Todo mundo aproveita para as propostas mais levianas possíveis.