O QUE ENCHE RIO É ÁGUA SUJA!

Nem a declaração infeliz de Jarbas Passarinho do ” às favas com a ética” , quando da edição do AI-5,  representou uma espécie de “captis diminutio” para a biografia deste grande homem público; nem a assinatura de Hélio Beltrão,  de apoio ao Ai-5 que ele, como arauto das liberdades civis e do respeito a cidadania, gerou-lhe com certeza, tantos aborrecimentos,  mas com certeza, não lhe diminuiu a dimensão de sua contribuição à causa nacional ; nem o conceito tão negativo que granjeou o Ministro Armando Falcão quando,  àquela época, se dizia “que qualquer Presidente precisa de um Armando Falcão para fazer as coisas sujas que o exercício do poder requer”, mudou a sua contribuição histórica.

Nenhum deles sentiu manchar as suas histórias, nem os fizeram desistir de suas vidas públicas nem diminuíram o relevante papel que cumpriram nas transformações do País. É fundamental entender que as circunstâncias históricas estabelecem freios e limites e definem contornos e restrições  ao chamado pragmatismo dos homens públicos que fica difícil julgá-los de maneira tão simplória!

Quantas vezes o pragmatismo dos tempos  heróicos de um Tancredo Neves, na antevéspera das definições do Colégio Eleitoral, quando tudo era nebuloso e todos buscavam antever o que seria do Brasil, buscando uma dramática saída do estado autoritário, foi ele tentado a fazer concessões que lhe permitissem, sem macular o itinerário do projeto de redemocratização do País, realizar o seu desideratum?

 Durante as disputas do Colégio Eleitoral contam que, um dia, um esbaforido Fernando Lyra veio ao encontro de Tancredo para relatar-lhe que Paulo Maluf havia comprado o voto do índio parlamentar Cacique Juruna, pagando o preço de 100 bois!  A indignação de Lyra não comoveu Tancredo que respondeu a tal indignação com um gesto de assustador pragmatismo ; “vá até ele e o recompre”!  Se foi verdade ou não o fato é que Juruna desistiu de Maluf e apoiou Tancredo.

Faz bem, nesse momento de escolhas e de opções, recordar um episódio que marca o pragmatismo de resultados e que reduz o significado e a importância  das críticas e restrições de quem está de fora do jogo, costuma se amparar. Quando, no auge da disputa, um grupo de deputados malufistas já se antecipavam numa possível virada pró-Tancredo,  o futuro Ministro da Justiça de Tancredo, deputado Fetnando Lyra,  perguntava,  indignado, a um grupo de futuros auxiliares do novo Presidente, sentados numa longa mesa no Sítio Pericumã, de Sarney, se não seria descaracterizar o movimento aceitar-se a adesão de malufistas à causa da abertura democrática.

Se, de forma eloquente, indagava ele, isto não representaria conspurcar todo o esforço realizado até ali pelos que lutavam pela redemocratizacso do Pais. Tancredo, sábio como sempre, mordendo a ponta da gravata, disse, em alto e bom som: “Vocês que me perdoem mas, em política, ninguém deve dar  nenhuma chance para a derrota. Ou seja, não interessa de onde  venham os apoios. Ē bom sempre lembrar que o que enche rio é água suja”, e concluiu dizendo “que venham os apoios e que a causa que defendemos seja vitoriosa”.

Estas ponderações e observações remetem a todos a refletir sobre três questões que estão a mexer com a cabeça dos brasileiros como um todo. A primeira é se o defenestrar Dilma do poder, reduzirá  a influência de Lula e levará  ao desaparelhamento do estado por sindicalistas, no mais das vezes, sem a necessária competência gerencial para tocar instituições e fazer andar projetos de maior relevância para o País. Além disso, se práticas nefastas adotadas pelos  petistas  nos fundos de pensão, nas agências regulatórias e nos bancos de desenvolvimento, serão corrigidas, sem maiores delongas, capazes de permitir, praticamente, salvar tais instituições.

A segunda pergunta que se faz é se as alianças necessárias à garantia da governabilidade não limitarão as possibilidades de promover algumas reformas fundamentais e de caráter estruturante com vistas ao enfrentamento de problemas graves,  como é o caso, por exemplo, do enorme buraco da previdência social. Na verdade, com a quantidade exagerada de partidos, com o desejo de participação no governo por parte de vários grupos, isto leva a escolha às vezes, técnica e eticamente limitadas.

A terceira colocação na cabeça das pessoas é se alguns políticos, hoje vistos e mostrados como indiciados ou denunciados por crimes de corrupção, terão a chance de se safar e se salvar e, em que medida, a sociedade aceitará uma espécie de “redução da pena”, não por uma possível ou suposta delação premiada, mas pelo que fizeram para que o processo de IMPEACHMENT e a superação do quadro de crise económico-social do País, fosse objetivado e se concretizasse.

Assim, como no Mensalão, existiram figuras que, em parte, foram responsáveis pelo deslanchar de um processo que levantou o verdadeiro mar de lama em que já se mostrava mergulhado o governo central, coube ao Deputado Roberto Jefferson, o papel de denunciar as falcatruas, daquele dramático episódio.

E aqui é mister chamar a atenção para o fato de que  não importam as razões que motivaram o ex-deputado bem como a sua biografia e o seu passado, mesmo sendo réu confesso, nesse mesmo processo, e tendo pago o preço da prisão e do abreviar da sua carreira politica, acabou sendo visto, pela sociedade, como alguém que ajudou a desmontar um perigoso esquema que, se houvesse tido continuidade, os seus mentores, pelo talento, criatividade e esperteza, hoje estariam comandando, integralmente o país, suas instituições e  todo o  espetáculo.

Alias, é fundamental chamar a atenção para o fato de que o Mensalão representou o estágio probatório para aquele que é, indiscutivelmente, o mais abrangente, envolvente e ousado esquema de corrupção já montado, não apenas no Brasil mas em qualquer país do mundo. Também muitos dos denunciados e condenados agora no Petrolão, já apareciam como culpados, coniventes ou participantes do Mensalão, notadamente os seus principais mentores.

Claro está que se não houvesse a teimosia, a coragem moral e a determinação do Presidente do Supremo Tribunal Federal, MInistro Joaquim Barbosa que, com o apoio da mídia e da sociedade civil, enfrentou limitações, restrições, desafios e pressões de toda ordem mas chegou ao que pretendia ao condenar e prender culpados pelas diatribes ali cometidas, o Mensalão teria passado batido e os responsáveis não teriam sequer sido denunciados. Mas, é de justiça assinalar que, se não fora a CPI dos Correios e a atitude corajosa e ousada do ex-deputado Roberto Jefferson, provavelmente, até o Petrolão,/teria representado uma peça de ficção.

E agora, no processo que desvenda todos os desvios de conduta ocorridas no maior escândalo do mundo, no caso o Petrolão,  que levou a descoberta de escândalos como o da Eletrobrás, do BNDES, dos Fundos de Pensão, entre outros, figuras exponenciais de responsabilidade, espírito republicano e decência, como o Juiz Sérgio Moro, os procuradores e os policiais federais, engajados na Operação Lava-Jato, granjearam o respeito e a admiração dos brasileiros, pela atitude corajosa, destemida e séria no enfrentar toda ordem de chantagem e pressão, para indicar, denunciar, indiciar, prender e apenar grandes empreiteiros, políticos e outros figurões, procurando demonstrar que a impunidade não deve ser a regra no ambiente da justiça do País.

Mas, para que se aprofunde o trato da matéria, as pessoas se perguntam como julgar figuras da dimensão de um ex-Deputado Roberto Jefferson, ou de um Senador como Delcidio Amaral  ou o Dep. Eduardo Cunha, Presidente da Câmara,  esses que, muitas vezes,despertam o opróbrio de muitos mas que hoje se posicionam como uma espécie de “prostitutas respeitosas” como a personagem central do livro do brilhante escritor americano William Faulkner. Ou ainda, no dizer de Roberto Jefferson, que considerou Cunha de “meu bandido favorito” ou ainda no julgamento de muitos políticos, o “meu adorável cafajeste”, que tipo de julgamento terá perante a história contemporânea e futura, o atual Prrsidente da Câmara?

Merecem reflexões as ponderações de alguns analistas de que, se ora ele está sendo um dos principais responsáveis pela concretização do impedimento da Presidente, para um novo governo o seu papel é visto como de crucial relevância e seria de muita utilidade a Temer e ao País porquanto, com a liderança que detém na Câmara, com sua capacidade de artiulação,  largamente demonstrada no processo de IMPEACHMENT, com a competência gerencial para fazer andar projetos e medidas na Casa, não dispor de seu concurso, seria uma quase temeridade.

Para a maioria dos parlamentares, coube a ele dar a Câmara dos Deputados um protagonismo que, de, há muito, não se testemunhava.

Talento, competência e largos limites éticos e morais que as circunstância de mediação e negociação exigirão, diante de interlocutores que discutem preços e valores de apoios em dimensões bem conhecidas por Cunha, isto ele tem de sobra.

Ademais, com o prestigio que ganhou pela condução do processo de IMPEACHMENT, enfrentando restrições da casa, pressões do governo, questionamentos do Supremo, pesadas criticas da mídia, além das retaliações de Renan Calheiros, parece que ele se fortaleceu, perante os seus pares, para novos embates.

Ademais, do ponto de vista pessoal, pelo andar da carruagem, o próprio Conselho de Ética da Câmara deverá arquivar seu processo porquanto agora ele já dispõe de maioria no Colegiado o que, facilita e garante fôlego adicionais a Cunha, nas batalhas a serem travadas no Supremo.

Assim, não se sabe qual o julgamento que terá Eduardo Cunha mas se os que lhe fazem severas restrições na Camara só forem apenas cem deputados, como mostrados pela midia, a coisa marchará igual ao que aconteceu com os votos do governo que, além de serem insuficientes, minguaram no andar das negociações até chegar a apenas 137 apoiadores, ao final. E aí, Eduardo Cunha não será um Berlusconi que se tornou o líder político mais expressivo ao fim da “Operação Limpas” da Itália  mas um salvado do naufrágio.

2 Comentários em “O QUE ENCHE RIO É ÁGUA SUJA!

  1. Só um amigo sincero como você då-se o direito à tanta generosidade. Um abraço fraterno! E Felipe, ond anda?

  2. Brilhante texto Paulo!

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