OS DESEQUILÍBRIOS REGIONAIS: UMA QUESTÃO SEM ENCAMINHAMENTO!

Este cenarista viveu experiências ricas no que diz respeito a essa desgastante discussão sobre a questão nordestina. Sempre mal posta e mal discutida bem como, pèssimamente encaminhada, o repeteco dos dramas e problemas da população, continuam a  mostrar a mesma intensidade do que no passado. No passado, não muito distante, esse cenarista, aos 14 para 15 anos, vivia toda uma ideologia da nordestinidade, desenvolvida e estimulada por Celso Furtado, a Cepal e o Banco do Nordeste, bem como por uma pleiâde de seguidores de Celso, ávidos por encontrar uma resposta que conduzisse a um processo de superação da pobreza e do atraso que tomavam e ainda tomam conta da região. Também, como especialista em pesquisa e planejamento do BNB, o cenarista foi responsável pela coordenação do estudo de perspectivas do desenvolvimento do Nordeste para a década de oitenta, no capítulo relacionado à indústria. Da mesma forma que contribuiu com o Senado Federal, para a montagem do famoso relatório da COCENE, Comissão criada pelo Senado, específicamente para levantar, polìticamente, a questão regional.

Nunca as desigualdades de renda, entre regiões, foram tão amplamente discutidas quanto naquela época. O interesse, pelo menos demonstrado pelos nordestinos, era tamanho que, até na música, as várias facetas do drama regional eram espelhadas. Músicas que mostravam a aceitação pacífica e submissa de que a única saída para o nordestino era sofrer as agruras de retirantes a buscar a sobrevivência nas terras paulistas, decantadas por Patativa do Assaré, na bela poesia Triste Partida. Ou no lamento do cearense que, reconhecendo-se ignorante por “não saber rezar direito” , chora o excesso de chuva que inundou o seu Ceará, na bela canção Súplica Cearense. Ou ainda, um canto de revolta com o resto do País, clamando por uma separação, na música rebelde de Nordeste Independente, cantada por Elba Ramalho.

 

Nada de tais lamentos e tais protestos redundaram em alguma política efetiva de respostas aos desafios da miséria e do atraso regionais. Os órgãos regionais criados — BNB, CODEVASF, DNOCS, SUDENE — representaram uma grande frustração ou por falta de apoio da União ou por falta de um projeto consistente de transformação da área.

 

Por outro lado, mitos foram disseminados e continuam a ser disseminados relacionados ao Nordeste. Desde o mito relacionado a própria intervenção estatal na região, desconhecendo a existência de vários nordestes com vários problemas e potencialidades — zona da mata, agreste, faixa litorânea, região caucaueira, micro-climas especiais, etc —  até a tentativa de fazer do Nordeste um Tennessee Valley Authority ou um Mezzogiorno italiano, o que em nada redundou e reduziu a eficácia das intervenções federais.

 

Um outro mito cultivado  dizia  respeito a forma como foi sempre tratado o problema das secas. Primeiro,  o erro conceitual porquanto a idéia básica seria que as prioridades mais relevantes,  no que respeita ao problema de oferta dágua, seriam, simplesmente,garantir água para o povo beber, água para os animais beberem e água para as culturas. Tudo passaria por um planejamento estratégico bem concebido que se apoiaria no projeto de Transposição, não só das águas do São Francisco mas, também das águas do próprio Tocantins, com a integração das bacias e a recarga estratégica das barragens.

 

Um outro mito disseminado à larga, dizia respeito as “monumentais” transferências de renda do Centro para a periferia nordestina. Na verdade, dois estudos levados a efeito na região mostraram que, no balanço líquido entre entradas e saídas de recursos da região, o que houve, na verdade, foi perda líquida derivada da ação dos vários mecanismos de descapitalização que operavam na Região. Ou seja,  o que os estudos demonstraram foi a existência de  um resultado negativo para o Nordeste.

 

E, finalmente, toda essa questão relacionada à chamada guerra fiscal, porquanto inexista tal guerra, pois o que na verdade existe é o que se poderia chamar de competição fiscal, onde os estados resolvem abrir mão de receitas futuras com vistas a antecipar investimentos para alavancar o seu crescimento mais imediato.

 

Na verdade, pouco se discute como uma região deprimida poderia concorrer com uma região mais rica, na atração de investimentos e investidores,  na proporção em que as externalidades econômicas existentes nas áreas mais desenvolvidas, são sobejamente superiores ou quase se confrontam com as deseconomias externas das áreas mais pobres.

 

Diante de tal quadro, enquanto não houver um planejamento estratégico para a região, marcado por definição de investimentos públicos em infra-estrutura que ampliem as externalidades econômicas, além do estabelecimento de recursos de investimentos do BNDES para determinados segmentos estratégicos da região, não se conseguirá alterar o quadro de atraso econômico da Região. Claro está, que, recentemente, o Nordeste tem conseguido um dinamismo econômico maior que o resto do País por conta da “chamada guerra fiscal” , do desenvolvimento do turismo e de plataformas de serviços em função da mão de obra mais barata, da qualidade de vida melhor e do esforço de ousados e competentes dirigentes estaduais. Se houver, ao lado de tais fatores positivos, um volume mais intenso de investimentos públicos estratégicos e estruturantes,  será possível vislumbrar um futuro mais promissor de superação das desigualdades regionais do País.