TRAGÉDIAS ANUNCIADAS!
A literal destruição do Haiti, diante de fenômenos excepcionais da natureza, com o seu rastro de infortúnios e desgraças de pessoas e de famílias, de um já paupérrimo país, talvez tivesse pouco a ver com a omissão ou ação predatória e nefasta do homem ou das suas instituições.
Mas, o que ali ocorreu e ainda ocorre, não obstante gerar um momento de solidariedade e de mobilização das sociedades, por todo o mundo, no sentido de ajudar a superar os dramas mais imediatos e garantir os meios para o processo de reconstrução do País, deveria ser objeto de reflexão de países como o Brasil. Embora terremotos não sejam esperados ou previsíveis por estas plagas, pelo menos nas dimensões ocorridas no Haiti, existe um conjunto de circunstâncias propícias para que se manifestem tragédias, se não daquelas dimensões e proporções, mas que ora já estão a marcar a vida de muitas famílias brasileiras, máxime aquelas atingidas pelas enchentes que varreram e ainda varrem São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e, não há muito tempo atrás, Santa Catarina.
O Brasil, hoje, com mais de 80% de sua população vivendo nas cidades e mais de 53% vivendo nas grandes metrópoles, não se preparou para o mais elementar processo de planejamento de ocupação urbana que não permitisse criar situações dramáticas e, quem sabe, até catastróficas, como hoje estão a enfrentar tais populações.
E, talvez, o que ora ocorre em São Paulo e o que ocorreu, recentemente, em Angra dos Reis, mostra que os erros na ocupação urbana desordenada, no zoneamento inadequado ou inexistente, na falta de planejamento do saneamento ambiental, bem como da inexistência de todo um conjunto de providências destinadas a garantir um adequado escoamento de águas pluviais, pelas vias urbanas, não preparadas para volumes mais que previsíveis de chuvas, não estão afetando mais somente as populações de baixa renda, mas, também, as de alta renda, como a tragédia que se abateu sobre o balneário de Angra.
Até quando a questão urbana continuará sendo objeto de remendos ou, no máximo, de discursos demagógicos que a nada conduzem? Se não bastassem os tormentos causados pela violência urbana, pela piora continuada da qualidade de vida derivada de um processo angustiante de aumento da poluição ambiental, pela ineficiência provocada por um sistema de transportes que já faliu e não dá mostras que possa ser alterado, com a possível construção de novas vias, elevados, túneis, viadutos, etc., e arremedo de medidas na área dos transportes de massa, agora, fica patente que, se não forem redefinidas localizações para as populações, hoje nas áreas de riscos, de forma urgente e imediata, a tragédia repetir-se-á nas próximas águas e, talvez, com um número maior de vidas ceifadas!
E, diante de tal tragédia, ficam pequenas as tragédias ambientais, dos gargalos logísticos provocados pelas limitações da infra-estrutura, da previdência, da saúde, da violência, produzida por um consumo crescente de drogas, por parte dos jovens. O que se espera é que os candidatos à Presidência, ao invés da troca de insultos, das proverbiais promessas e do viver do já realizado ou do tentar vender glórias passadas, como promessa de coisas futuras, comecem a dizer ao povo o que é possível fazer para que se recrie a esperança de que tais dramas poderão e deverão ser enfrentados como algo de altíssima prioridade para a sociedade brasileira.
Se nada for feito, a coisa não ficará apenas naquilo que o país aprendeu a ver e não sentir, que sempre foi a procissão de miséria dos nordestinos diante da seca, da fome e até da sede, levando-os à morte à prestação ou a emigração humilhante. Que o país não continue a ser o país do futuro pois o presente hoje agride aos brasileiros, notadamente aqueles que ainda são cidadãos de segunda ou terceira categoria.
Quão antipático seria, porém extremamente necessário, falar a respeito das favelas no Rio de Janeiro. Excelente exemplo de como a política de desenvolvimento urbano é tratada nesse país.
No capítulo II da Constituição Federal, “da política urbana”, em seu artigo 182, caput e parágrafo primeiro, evidencia-se a obrigatoriedade de elaboração de um plano diretor que tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e GARANTIR O BEM-ESTAR DE SEUS HABITANTES. No entanto, ninguém toca nessa “ferida”!
Pelo contrário, o que podemos ver e ouvir nos noticiários é a tomada de paleativos de modo a não providenciar as corretas medidas, mas iludir os moradores na tentativa de levar até eles uma pseudo-cidadania a ponto de mudar denominação favela para “comunidade”. O que me parece uma tentativa bizonha de tentar esconder o que só os moradores sabem porque vivem e convivem com da falta de estrutura e cidadania, mas, ao mesmo tempo, são coniventes com essa situação, uma vez que repudiam a mudança de local. Claro, quem vai deixar uma vista linda como a da Comunidade do Jardim de Alah! Acho que nem eu que sou mais bobo!