POBREZA, IMPUNIDADE E ÉTICA

A questão da corrupção, que angustia e inquieta aos homens e mulheres de bem, daqui e d’alhures, é tema que sempre aflora quando se discute a omissão, a ineficiência, a incompetência e o descaso do estado, notadamente para com as prioridades dos cidadãos, máxime, aqueles desprotegidos, socialmente!

Em episódios como o da tragédia de Niterói, onde várias vidas foram ceifadas, a responsabilidade maior sempre coube às autoridades públicas que permitiram que ao longo dos anos, fossem assentadas habitações, pasmem, em cima de um lixão desativado!

Em Angra dos Reis, balneário de afortunados, algo assemelhado ocorreu. Da mesma forma que, há pouco, se assistiu tragédia parecida no Rio de Janeiro, quando a irresponsabilidade, a leviandade e o oportunismo das autoridades constituídas, permitiu a construção de milhares de habitações, em áreas de risco!

Os interesses especulativos, a falta de políticas públicas relativas ao ordenamento e a ocupação dos espaços urbanos e, principalmente, o embate de interesses político-eleiçoeiros, foram responsáveis pela ocupação criminosa dos morros da bela Velhacap, hoje com um intenso adensamento e um crescimento desordenado das populações faveladas, gerando todo um caldo de cultura de problemas e patologias sociais, não somente de exclusão bem como de violência de todos os matizes.

Aliás, o que se poderá esperar das medidas duras e amargas de relocalização das populações de áreas de risco do Rio e de outras grandes cidades brasileiras, prometidas pelas autoridades, após esses dramáticos eventos, dentro de um quadro de eleições, quase gerais, como as desse ano? Provavelmente, nada ocorrerá para confirmar a tese de que os interesses político-eleiçoeiros vão se sobrepor às urgências e prioridades da cidadania.

Mas, qual o substrato de tudo isto ou o que está por detrás desse descaso, dessa negligência, dessa irresponsabilidade para com a vida e a dignidade das pessoas? Quais são os elementos determinantes de tal postura e de tal atitude da elite dirigente ou quais as razões que conduzem a essa irresponsabilidade criminosas das elites?

O que se assiste, nos dias que correm neste país, é que a corrupção permeia todas as decisões, quer estratégicas quer operacionais, tomadas pelos poderes constituídos. Ou seja, a regra básica que se assiste, perplexo, é a chamada “mais valia da esperteza” que está a definir todos os critérios das ações do setor público do País!
E, em assim ocorrendo, quando a prática comum é a corrupção, o problema se torna mais grave porquanto corrupto e corruptor, faces de uma mesma moeda e de uma mesma tragédia, solidários na contravenção, são estimulados pela notória, alastrada e quase endêmica impunidade!

De um modo geral, a impunidade tem sido a mãe da corrupção e de suas conseqüências, embora a ela se juntem a leniência da justiça e a conivência da sociedade que, na sua lógica, só consagra o vencedor. E, não importa como e quais os meios da conquista. Em sendo vencedor, não importa se a conquista tenha tido como base a esperteza e até a safadeza. O autor é recebido com todas as honras e saudado por todos os detentores do poder da sociedade, por ter superado desafios. Mesmo que, para tanto, todos saibam, tenha ele atropelado tantos e violentado todos os princípios, valores morais, éticos e tenha passado por cima de quem e do que se colocasse à sua frente.

Foram-se os tempos da ética do compromisso e da ética da responsabilidade. Foi-se o tempo onde “ao rei tudo menos a honra”, não era apenas um desabafo ou uma frase de efeito, pronunciada em determinado momento ou circunstância fortuitas, mas uma resposta a quem desafiava à consciência e o dever cívico de homens dignos, decentes e de compromisso com a história.

Foi-se o tempo em que os eleitores orgulhavam-se dos seus representantes e os mesmos tinham especial respeito pela sua própria história e biografia. O que hoje se vê é, até mesmo a própria mídia, subordinando-se a interesses materiais e comerciais, exaltar conhecidos delinquentes; a dita “alta sociedade”, absorvendo conhecidos trapaceiros e a política acolhendo, em seu seio, traficantes e assaltantes enquanto escanteia e, às vezes, até enxota, políticos ou promessas políticas e homens públicos éticos e de elevado espírito público.

E isto é lamentável e é doloroso, bem como deixa as pessoas sérias deste país, cada vez mais desencantadas e pessimistas. Parece que a solidariedade na contravenção é a regra de convivência daqueles que fazem do oportunismo e da esperteza, valores que superam o mérito e a ética do compromisso!

O Brasil não precisa de um choque de gestão! O Brasil não precisa de um choque de modernidade! O Brasil precisa, sim, como disse Capistrano de Abreu, de um choque de moral e de vergonha!